13 December 2007

Eike Batista é um empresário de visão?

Na semana passada, Eike Batista investiu R$ 1,6 bilhão, em 28 áreas de exploração de petróleo e gás, no Leilão da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Alguns dizem que pagou caro, outros que é arrojado. Mas, foi negociando dessa maneira e colocando a letra “X” no nome da empresas, como símbolo da multiplicação, que ele dobrou seu patrimônio, avaliado hoje em US$ 15 bilhões.

Mas, ao observar melhor como seus empreendimentos são implantados é fácil perceber que a ousadia desse empresário se assenta em procedimentos um tanto inconseqüentes. Como um pirata trabalha com risco calculado e desrespeita os princípios de responsabilidade social e ambiental.

A Siderúrgica MMX, de Corumbá, já teve vários problemas com a justiça em função de seus escandalosos processos de licenciamento ambiental, chegando ser interditada por uma ação do Ministério Público Federal. O Ibama de MS autuou a empresa em um milhão de reais, por comprar carvão vegetal de um local sem licença, irregular, no meio do Pantanal e, para piorar, em área indígena. No Amapá, a MMX está sendo acusada pelo Ministério Público Federal (MPF) por danos coletivos. A empresa construiu sua usina no município de Pedra Branca do Amapari sem licença ambiental. A indenização pedida pelo MPF foi de US$ 35,7 milhões.

A última do empresário, é o investimento num porto de calado profundo em Peruíbe (SP) orçado em R$ 3 bilhões. O único detalhe é que a área fica no mesmo local onde a Funai pretende instalar uma reserva indígena. Quem será que vai ganhar? O empresário visionário ou os índios? Mas esses não são os únicos investimentos que esbarram nas questões sociais e ambientais, procure saber mais sobre os investimentos no Rio de Janeiro e em Minas Gerais.

*Patrícia Zerlotti é jornalista, membro do NEM e coordenadora de projeto da ong Ecoa-Ecologia e Ação.

07 December 2007

Do carro elétrico ao agrocombustível

Em 2001, a GM lançou no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, um modelo de carro inovador, teoricamente não poluente, que usava baterias carregáveis em postos especiais ou mesmo em casa. Em pouco mais de dois anos, o veículo elétrico, que poderia ser a saída para os combustíveis de origem fóssil, já não existia mais.

Muitos se perguntaram o porquê dessa idéia não ter dado certo. Seria falta de interesse dos americanos, posto que o carro tinha autonomia para circular apenas 120 quilômetros, antes de ter que recarregar a bateria? Seria falta de visão da mídia, que não divulgou a idéia de forma massiva? Seria uma falha da estratégia de marketing da GM? Ou seria uma omissão do governo, que não viu na proposta uma saída para independência do petróleo? Infelizmente, todas as respostas estão certas, ainda que alguns dos americanos que acreditaram no carro elétrico tivessem tentado manter seus veículos. Mas como a empresa só havia vendidos os carros em forma de leasing, obrigou que todos devolvessem os veículos, reembolsando o crédito pago ou subsidiando a compra de outros veículos. Todos os carros foram destruídos pela montadora.

Essa história, que pode ser conferida no documentário Quem matou o carro elétrico?, ilustra bem a dificuldade das alternativas econômicas, sociais e ambientais quando tentam enfrentar o status quo. A pergunta, neste caso, é como a GM investiu milhões de dólares numa tecnologia e depois não só abandonou, como também não deixou a oportunidade de testarem e demonstrarem a eficácia da tecnologia? A resposta, fácil e perversa, é que a indústria do petróleo estava por trás no desmonte no carro elétrico e conseguiu desbancar a idéia.

Enquanto morria o carro elétrico nos Estados Unidos, uma tecnologia inovadora surgia no Brasil e parecia ser uma resposta à altura. Era o princípio do biodiesel, uma saída ambientalmente saudável, principalmente para a agricultura familiar, que poderiam ver, no futuro, sua independência energética. Passados quatro anos o que nós vimos foi uma mudança de paradigma. Biodiesel virou agrocombustível.

O “bio”(que significa vida) dos pequenos agricultores foi transformado em negócio pelos latifundiários, virou moeda de troca no governo Lula, vedete das mudanças climáticas, e se transformou no agrocombustível. Juntou-se a ele o álcool, ressuscitado com novo nome: Etanol. A alternativa foi surrupiada de tal maneira como muitos não imaginavam que aconteceria. Pelo menos não no governo Lula. A nova solução do desenvolvimento sustentável, outra idéia deformada pelos empresários e governos, se virou contra quem mais precisa de alternativas. De tal forma que a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse na abertura do II Encontro dos Povos Floresta, em setembro deste ano, que ainda seria possível produzir no Brasil mais de 30 milhões de litros de álcool (desculpe o engano, etanol) por ano sem agredir o meio ambiente. A idéia que, acredito, a ministra queria passar era de que a plantação seria feita em áreas já abertas para a agropecuária e abandonas por conta na queda da produção da pecuária e também da soja.

Essa idéia poderia até passar como verdade para um grande número de pessoas, se ignorada a prática comum da queima em plantações canavieiras e o fato de que essa é a atividade número 1 em trabalho escravo no país, se não fosse um fato: o aumento do desmatamento. As quedas recordes, anunciadas com louvores por dois anos seguidos começa a mostrar que há uma retomada no desflorestamento. De acordo com dados do Instituto do Homem e do Meio Ambiente na Amazônia – Imazon e Instituto Centro de Vida – ICV, foram desmatados em Mato Grosso, no mês agosto de 2007 uma área de 250 quilômetros quadrados, um aumento de 228% se comparado ao mês anterior, julho. Ou um aumento de 138% se comparado a agosto de 2006.

No que se refere às queimadas, entre junho e setembro em Mato Grosso foram registrados 44.621 focos de calor em Mato Grosso, um aumento de 72% com relação ao mesmo período do ano anterior (25.938 focos). Considerando apenas o mês de setembro, o total de focos de calor em setembro de 2007 (26.781) superou o mês de setembro de 2005 (21.937).

Ou seja, apesar da Operação Curupira deflagrada em 2005, que transformou o governador Blairo Maggi de estuprador da floresta a governador “ambientalista”, e do dólar - teoricamente o principal termômetro da soja - continuar decrescendo, principalmente por conta da recessão que assombra os Estados Unidos, o desmatamento e as queimadas aumentaram este ano. Uma conta que ajuda a explicar isso é que no Estado, de acordo com dados da Secretaria da Fazenda – SEFAZ, já existem 41 usinas de “biodiesel”, leia-se agrocombustível, cadastradas, produzindo combustível a partir de uma certa oleaginosa.

A Associação Brasileira de Indústrias de Óleos Vegetais – Abiove prevê que no ano que vem serão esmagadas 31,5 milhões de toneladas de soja, um aumento de 9,7% se comparado a safra de 2006/2007. O principal fator desse otimismo é o anúncio da Cargill, que irá construir em 2008 uma nova fábrica de processamento em Mato Grosso, aumentando sua capacidade no país em 25%. A Bunge também planeja o mesmo mas ainda não anunciou datas. O último fator no aspecto do agronegócio, que ajuda a engrossar o caldo da expansão da soja e do desmatamento, é a promessa do presidente Lula em sua campanha para a reeleição. A partir do ano que vem a mistura do “biodiesel” (leia-se agrocombustível) se torna obrigatória.

A ameaça da expansão da soja e da cana, que parecia difícil com os dois últimos dados do governo federal apontando queda no desmatamento, agora se mostra factível não pela valorização do dólar mas pelo incentivo que o próprio governo está dando. Não é difícil imaginar a pressão que a agricultura familiar sentirá, ou melhor já está sentindo, nesse novo impulso do agronegócio, agora com motivos pretensamente nobres: produzir um combustível limpo. Talvez até tenha menos poluentes, mas não tem nada de limpo. Governos e empresários começam a tentar seduzir agricultores familiares de que o agrocombustível será uma nova forma de renda, mas o provável é que aconteça o mesmo que a produção de leite, em que famílias com poucas vacas se vêem obrigadas a vender o leite a preços baixíssimos a lacticínios da região para ter um mínimo de renda, bem abaixo do que se tivessem diversificado sua produção.

Enfim, o carro elétrico não deu certo nos Estados Unidos porque havia uma pressão de vários setores, inclusive o automobilístico, para que ele não desse certo. No caso do agrocombustível, está se transformando na salvação da lavoura, porque pelo menos dois setores (o governo e os grandes produtores rurais) estão bastante empenhados e com uma retórica eficiente. Mas a lavoura está produzindo alimento para os veículos e para os bolsos dos empresários enquanto mata de fome quem quer produzir comida.

André Alves
* jornalista em Cuiabá. É secretário-executivo do Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente – Formad e membro-fundador do Núcleo de Ecojornalistas dos Matos - NEM.

30 November 2007

Saudades do jornal

Quem conhece o norte de Mato Grosso (e imagino que tantas outras regiões do país) talvez já esteja com saudades do barulho incessante e irritantemente diário de carros de som que circulam com propagandas de supermercado, churrascarias, açougues, pizzaria, lojas de eletrodomésticos, campanhas para controle da dengue. Tem até garoto com uniforme de colégio que, quando não está em sala de aula, aceita fazer uns bicos puxando carrinho com alto-falantes que circulam por todas as ruas, atazanando quem se refugia dentro de casa. Mas a estratégia é válida. Em meia manhã a cidade inteira já está informada, e resolve assim um problema a meu ver crônico e sintomático de falta de jornal.

Não há, para mim, outra explicação melhor. Pois realmente não existe maneira alternativa de as pessoas se informarem sobre promoções, ofertas, produtos novos que chegam à cidade senão pelo alto-falante ou pelas mensagens que as caminhonetes exibem nos vidros dos veículos quando circulam pela cidade. Em Juína é assim. Parece uma forma bem antiquada de comunicação, mas se a população não tem o hábito de ler, nem a possibilidade de comprar ou receber informativos impressos diariamente em suas casas, esse foi o jeito que o comércio encontrou de vender.

Na maior cidade do noroeste de Mato Grosso, considerada pólo para todas as demais, existe um jornal quinzenal redigido e distribuído pelo proprietário-editor chefe-apresentador de um dos três canais de televisão locais. É o mais visto por aqui. O encarte, que tem em média quatro páginas, traz notícias sobre a região, editorial assinado pelo próprio e, claro, propaganda dos fiéis patrocinadores, os comerciantes da cidade. O jornalzinho pode ser encontrado na recepção de hotéis, salões de beleza ou em locais de atendimento ao público, mas não dentro das residências. Não sei dizer se realmente as pessoas lêem o que está escrito ali, e consideram a publicação um instrumento informativo, pois imagino que a falta de um jornalista formado ou de qualquer pessoa que tenha mínimos conhecimentos sobre a língua portuguesa atrapalhe o entendimento do que está escrito. São inúmeros erros básicos de concordância, gramática, coerência. Sem falar em problemas um pouco mais complexos como a escolha da notícia (quase sempre propaganda política explícita), o foco dos textos, a apresentação atraente e objetiva para o leitor. Preceitos fundamentais para a atividade de informar e ser informado e que estão absolutamente ausentes na única publicação periódica na cidade.

É bem verdade que existem outras poucas alternativas, como um jornalzinho de formato e distribuição semelhante, mas menos prestigiado. E uma revista mensal, com a mesma linha editorial. Sem falar nas rádios, quase todas de cunho religioso. Mas que, por melhor que sejam, não substituem o bom e velho jornal de todo dia. Numa cidade em que a grande maioria tem baixíssimo poder aquisitivo e não pode pagar uma antena parabólica para receber os canais abertos do resto do país (já que sem antena o péssimo sinal simplesmente não pega) e muito menos pode gastar com uma mensalidade de televisão por assinatura, a população se torna carente também de notícias.

É possível (e quero investigar nos próximos dias) que isso tenha um reflexo na formação intelectual e no senso crítico de adultos e crianças, estudantes ou não. Sem informação qualificada, não há quem possa opinar, criticar, reclamar sobre direitos e deveres, em âmbitos local, regional, estadual e nacional. Não me admira compreender agora, por que, no fatídico episódio em que o Greenpeace foi expulso de Juína pelos fazendeiros da região do Rio Preto, aqueles que não se juntaram para retirar a liberdade de expressão e deslocamento da equipe ficaram apáticos assistindo as cenas, como se fossem normais. Num cenário desses, quem é que lembra do meio ambiente?

Com péssimas estradas que servem a cidade, o deslocamento da população é esporádico e muito penoso. Quando é preciso sair e ter a chance de visualizar toda a degradação do entorno, falta a percepção de que a destruição é criminosa. E de formação sobre porque recuperar, qualificação para fazer isso, além da compreensão básica de que as escassez de chuvas, a falta d'água, o empobrecimento do solo, as doenças tropicais e tantos outros problemas têm relação com os cuidados (ou a falta de) diante da natureza. Isso, que é noticia, e é informação para formação crítica das pessoas, não está em nenhum jornal. Teorias conspiratórias à parte, ou simplesmente por desleixo institucional, parece bem cômodo que a população não possa se armar com o que dela nunca ninguém poderia tirar, o conhecimento para mudar e melhorar.

19 November 2007

Mais que uma viagem, uma oportunidade para refletir

Serra do Amolar no Pantanal. Foto: Patrícia Zerlotti

Em tempos de mundo globalizado, crescimento da China, era do álcool, valorização da água, queda do dólar, consumo natalino, copa de 2014, trânsito... surge a oportunidade e o privilégio de visitar o Pantanal sul-mato-grossense.

Foram 20 horas de barco, subindo o rio Paraguai, para chegar a primeira parada, na Serra do Amolar, a 206 KM do nosso ponto de partida, o município de Corumbá, MS. Esta é a segunda vez que visito o Pantanal, a sensação de conhecer o ambiente pantaneiro é bem diferente de visitar as cidades pantaneiras, que também possuem características únicas.

Estas reflexões não foram feitas durante a viagem, pois no meio do Pantanal, realmente, não tem como ficar pensando em tudo e mais um pouco. Sem telefone, celular, internet e TV o momento é propício para observar e curtir as paisagens e as estrelas.

Entretanto, ao retornar para cidade, relatórios, trânsito, enchentes... Não teve jeito, a realidade veio a tona e os pensamentos voltaram, mas desta vez tudo estava relacionado com o Pantanal. O primeiro a despertar foi a necessidade de conservar este riquíssimo bioma. Sei que não é novidade para ninguém, mas percebi, ao voltar do Pantanal, que o sentimento havia se renovado e fortalecido. Não sei se porque fiquei mais sensibilizada ou porque as ameaças estão cada vez mais latentes!

Seguindo o raciocínio, me veio a mente o quanto é frágil este sistema de áreas úmidas que é regido pelas águas e que qualquer interferência pode ser crucial. Então, para a preocupação aumentar, tem as ações antrópicas, que acontecem no planalto da bacia e também na própria planície pantaneira. São desmatamentos, assoreamentos dos rios, pequenas centrais hidrelétricas, siderúrgicas, hidrovia e muitos outros.

Neste momento de reflexão não poderia esquecer as famílias ribeirinhas, pessoas humildes, sofridas e praticamente abandonadas. É importante ressaltar a diferença entre a população ribeirinha e os pequenos proprietários, que detêm mais recursos e consequentemente uma moradia melhor - nem por isso menos resistente - mas que também têm um papel fundamental na conservação do ambiente e da cultura pantaneira.

Porém, o que mais me chama atenção não são as necessidades dessa população ribeirinha, mas sim algo que eles têm e quase todos que moram na cidade não têm. É tempo para viver a vida como ela deve ser. Hoje vivemos correndo para o trabalho, para faculdade, escola, casa, amigos, família sem tempo de aproveitar cada emoção proporcionada pela vida. Até quando suportaremos este ritmo e até quando teremos lugares como o Pantanal que proporciona momentos de tranqüilidade e reflexão?


Veja mais informações e as fotos da viagem no site
www.ecoa.org.br

09 November 2007

Desmatamento à vista

Enquanto dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe/MCT) indicam uma tendência clara de aceleração do desmatamento na Amazônia, ruralistas fazem lobby no Congresso para alterar o Código Florestal. Eles até conseguiram tomar as rédeas do projeto de lei 6424/05 quando este foi parar na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados. O relator escolhido é o deputado Homero Pereira (PR-MT), lógico, integrante da bancada ruralista.

A proposição, de autoria do paraense Flexa Ribeiro (PSDB), foi aprovada no Senado, no final de 2005. Mas existem polêmicas desde que a lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, que regulamenta o Código Florestal, passou por alterações ao longo dos anos. De um lado os ruralistas com suas articulações no Congresso Nacional para reduzir o mínimo possível a obrigações do proprietário com a manutenção de florestas nativas e de outro as ONGs lutando para inibir o desmatamento com a defesa da Reserva Legal e as Áreas de Preservação Permanente (APP).

Hoje, por vitória das organizações ambientalistas, o texto em vigor determina que na Amazônia Legal a Reserva Legal seja de 80% para propriedades rurais localizadas em áreas de floresta, 35% nas áreas de Cerrado, e 20% para áreas localizadas em área de campo natural em qualquer região do país. Entretanto, não se sabe até quando o Código Florestal vai durar sem novas modificações, com essa pressão dos ruralistas no Congresso.

O Ministério do Meio Ambiente, por intermédio de sua Secretaria Executiva, apresentou versão de substitutivo do PL. A negociação faz parte dos compromissos assumidos quando da votação que criou o Instituto Chico Mendes. A proposta deve passar agora por uma discussão no âmbito da Comissão de Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados e seguir para votação, após acordo das lideranças.

O PL 6424/05 depois da Agricultura será apreciado pela Comissão de Meio Ambiente e Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), antes de retornar ao Senado (Casa Legislativa originária) para análise das alterações feitas pela Câmara.

Se aprovada, segundo os ambientalistas, a proposta vai intensificar o desmatamento na Amazônia. O Greenpeace divulgou um comunicado dizendo que a aprovação do projeto seria o 'começo do fim da Amazônia' e que as alterações propostas vão 'arrombar de vez as portas da floresta, transformando em terra arrasada tudo o que já foi conseguido em termos de proteção a esses ecossistemas'.

Sem contar ainda que com a pressão do mercado externo, existe a tendência de recuperação do setor agrícola. Segundo a Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA) a estimativa ainda para 2007 é de um crescimento de 4,5% do PIB do agronegócio brasileiro. E sabemos que o tamanho do PIB está indiretamente ligado ao tamanho do desmatamento.

O secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente (MMA), João Paulo Capobianco, reconheceu a necessidade de providências imediatas para conter o avanço da prática ilegal. Mas eximiu o governo da culpa do aumento do corte de vegetação no segundo semestre deste ano. Responsabiliza a seca prolongada, o aumento do preço internacional da soja e o da carne bovina.

Mesmo assim o MMA corre para iniciar a revisão do Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento da Amazônia (PPCDAM), composto de ações de monitoramento e controle, ordenamento territorial e fomento à atividades sustentáveis. Resta saber como a empreitada vai vingar se essas ações não dependem apenas do Meio Ambiente. Há, pelo menos, mais de dez ministérios envolvidos. E isso é tido como um dos principais fatores que fez desandar o antigo plano: a falta de transversalidade entre as organizações envolvidas.

Tomara que haja tempo para evitar que mais áreas de florestas sejam perdidas, apesar das indicações que há mais desmatamento à vista.


Clarissa Presotti
Jornalista e mestranda em Desenvolvimento Sustentável na UnB

30 October 2007

Dois anos sem o Francelmo

Há dois anos (12 de novembro de 2005) perdi um grande amigo, hoje só lembrança.
Era um velho ambientalista com coração de criança.
Sabe aquelas pessoas verdinhas?
Mas que nunca eram chatinhas?
Era um ambientalista sem ser
Tinha poder mas nunca precisou ter
E no dia 12 de novembro,
Naquela manhã de manifestação,
Ainda dói o coração quando lembro,
Que achei aquele homem em chama
Mais um doido-varrido que acordou do lado esquerdo da cama...
Puro erro, era o Francelmo, meu amigo
Era meu professor querido
Era uma mensagem infinita
Ainda hoje é um grande enigma
Para mim e para muitas pessoas.
Francelmo, rezo um pai nosso pra ti,
Rezo para voltar a ser um guri.

No teu enterro, tudo era poesia,
E cercado de amigos, naquela tarde vazia,
A gente chorou silenciosamente, você ouviu os soluços?
Teve governador que falou bobeira, mas teve bruto que ficou mudo.
E a cena mais bonita, foi ver o local escolhido para seu descanso,
No fim da oração, era fim de dia, últimos raios de sol, ouvimos um canto,
Na goiabeira que fazia sombra em seu túmulo, chorou também um pardalzinho manso.

O Francelmo desencarnou no dia 13 de novembro, uma grande ironia ao PT, que ele há muitos anos já não acreditava mais. Só consegui escrever meu desabafo sete dias depois de sua imolação. Daquilo que escrevi, ainda pulsa dentro a memória, não a dor! Mas a incógnita de uma ação tão forte, quase sem sentido, mas ainda assim muito profunda. Escrevi algo, que gostaria de compartilhar com vocês. E logo depois, coloquei o texto da Eugênia Amaral, doutora em ecologia pela Unicamp e professora da UFMS. Os dois textos foram publicados em novembro de 2005.

Perdoem a ausência de novos textos, nada mudou por aqui, as usinas de álcool estão chegando, os pólos siderúrgicos do Pantanal estão sendo inaugurados, as carvoarias estão sem controle... e Francelmo já dizia tudo isso que está acontecendo.

E quem quiser... que comente!

O Elmo Francelmo
(Para o Francisco do Pantanal)

O Francisco Anselmo,
Tinha o codinome: Francelmo.
Defendia bicho e gente,
Protegia árvore... da raiz à semente.

Quando me apresentaram,
Assim me disseram:
Aqui no MS, é o primeiro ambientalista
Bem centrado e realista, idealista.

Esse cara bacana
Não era contra só usina de cana,
Para a gente ter equilíbrio mínimo,
Lutava contra hidrovia e cia.

Era pai, marido, amigo,
Não era doido varrido!
E quando era preciso,
Dava uma de homem sabido.

Velho Francelmo, que deixou seu povo,
A mente intelectual, faz do homem um tolo,
Quando não compreende sua mensagem final.
Que é fazer em vida mais que racional animal.

Gente boa e sorridente,
Cabra da peste valente,
Que enfrenta prefeito,
E monitora os defeitos.

Dos políticos estúpidos,
Para dar vida aos utópicos,
Sonhando prá gente saber,
Que vale à pena viver!

Ambientalista pioneiro,
Também, ecojornalista primeiro.
Francisco do Pantanal,
Nunca foi um cara boçal!

Ele é dos primeiros a defender o Pantanal!!!
E árvore, Cerrado, animal e vegetal!
Ele fez e viu história,
Logo, deixou memória.

Estúpidas políticas ambientais,
Que degradam minerais, animais e vegetais.
Todas testemunhadas pelo Francelmo,
Que ainda não sei se fez errado ou certo.

Toda sua ação traz reflexão,
Prá gente pensar mais no coração,
Do que tentar achar razão.
Prá compreender essa emoção.

Era mais ou menos assim:
O Francelmo dizia pra mim:
"Meu filho, vamu cumigo
Pra evitar um pirigo!

Vai cabra, pega sua máquina fotográfica
E vamos fazer uma coisa prática,
Passo aí de carro, se disser não, me insulta!!!
E também, é prá depois você não sentir culpa!"

O tiozinho,
às vezes era como mosquitinho,
Ficava umas semanas inteiras
Vigiando as octogenárias figueiras.

Lixão, e os "sem-noção",
Reserva de Cerrado, de um povo já ferrado,
Pólo mínero, siderúrgico, gás-químico,
"Xô Transgênicos", nos espíritos efêmeros!

Na hora do crime,
Ele avisava: "pega rolo de filme!
Os jornalistas devem atuar, flagrar!
E a gente e a natureza tentar salvar!

Tratava todo mundo com respeito
Às vezes, quando um problema não tinha jeito,
Insistia, persistia e sempre agia
O que queria, era dar pro povo vida sadia.

Entendia a burocracia,
E adorava a democracia!
Era só alegria, amigo e ternura,
Cavalheiro, companheiro, falava às vezes com altura, direto e sem frescura!

Eu sou jornalista, ambientalista,
Não sou socialista, comunista,
Nem filiado a partidos com ou sem sentidos,
Sou um rebelde com causa e juízo.

Francelmo escreve uma canção,
Sua vida no planeta não foi em vão.
Lixão, degradação,
Desumana condição.

Nesta batalha silenciada até então,
A crônica final de um homem são,
É gargalhar da "egologia" perder prá ecologia.
É observar uma só utopia virar sabedoria.

Isso só ocorre quando a gente,
Pára um pouco e pensa na mente:
Mais que dor de picada de serpente,
Deve ser o fogo ardente.

Igni Natura Renovatur Integra
(O fogo renova completamente a natureza)
Francelmo, espero que seja um elmo,
Que seja um escudo eterno.

De capacetes antigos,
Que protegiam os amigos,
Na Gálea, viseira de diamante "mui seguro",
"De Júpiter, armado, forte e duro."

Tu, que protegia canteiro, bairro, cidade e Pantanal.
Mesmo sem saber o seu estado atual,
A filosofia diz prá seguir com tua utopia,
Prá recordar de velhas ideologias.

Você nos dizia:
- Meu filho, minha filha!...
(Com seu sotaque cearence-bahiano),
- A ganância cresce a cada ano.

Pra defender nossas riquezas,
É preciso perpetuar nossas belezas,
Da cidade, do Cerrado, do Pantanal às miudezas.
Cotidianas, óbvias, atuais e mundanas.

Quando no povo e nas suas memórias,
Forem divulgadas tuas histórias,
Vão saber que tu libertou a natureza
De ser presa, porque você fez uma "Teresa".

E então, o ser irracional,
Compreenderá que usina no Pantanal
Não é a principal nem a maior ameaça.
E sim, a ambição e a ganância dessa raça.

Allison Ishy

Notas:
1. Igni Natura Renovatur Integra - INRI, segundo alguns ocultistas e filósofos;
2. "De Júpiter, armado, forte e duro." - Luis de Camões.
3. "Teresa" - gíria para a corda feita com lençóis para fugir pelas janelas/muros das prisões.


MARTÍRIO NO SÉCULO XXI
Por Maria Eugênia Carvalho do Amaral

O ambientalista Francisco Anselmo Gomes de Barros faleceu no domingo, dia 13 de novembro do ano de 2005 d.C., século XXI. Sua morte, em conseqüência de graves queimaduras provocadas pelo ato voluntário de atear fogo ao próprio corpo, deixou-me chocada, aterrorizada e muito triste. A violência do ato, registrada ao vivo e em cores, transportou-me para um daqueles séculos sombrios em que despojados mártires sacrificavam-se em praça pública por uma causa, por uma fé, por um propósito de dedicação imensurável. Uma dedicação extrema. Sem medidas. Uma causa tão grande e tão poderosa como a própria vida.

É quase impossível raciocinar dentro de parâmetros de tamanha amplitude. E assim, no limiar do racional, fiquei pensando se o Pantanal, se as tais usinas de álcool, se o jogo político e os interesses econômicos de certos grupos valiam a vida do Anselmo. Recuso-me a aceitar que sim. A vida é uma dádiva, é sacra. Os interesses sobre as usinas são profanos. E fui surpreendida por um pensamento talvez romântico: a eterna luta entre o bem e o mal, entre o sacro e o profano. Uma simplificação perigosa. Um deslize quase cínico.

Retomei meu raciocínio e fiquei ainda mais chocada com o que intuí: não existem mártires no século XXI. Mal Francisco Anselmo faleceu, já afloram críticas e mais críticas... Mas não são somente as esperadas, sobre as usinas de álcool, e sim aquelas dirigidas ao ato do ambientalista, como se ele nos devesse um “espetáculo melhor”, como se ele tivesse “aproveitado mal as possibilidades de sair na mídia”. Maldito século XXI! O século da banalização da vida, tornada coisa descartável. O século da deterioração dos valores morais. O século em que roubar se transformou em sinônimo de “tradição da cultura política”. Século XXI... O século em que morrer por uma causa tornou-se piegas, fora de moda, sem sentido.

Recuso-me a aceitar tais mudanças. Ainda acredito em valores à moda antiga. Ainda acredito na palavra dada. Ainda acredito na vida por uma causa. Ainda acredito que as tais usinas de álcool – que eram ruins para o Pantanal há cerca de 30 anos – continuam sendo uma péssima proposta para o desenvolvimento econômico local se instaladas na Bacia do Alto Paraguai.

E, mais do que acreditar na inadequação de tais usinas, acho sua proposta cínica. É puro cinismo retomar uma proposição rejeitada pela sociedade e pelo Estado (Lei 328 de 25 de fevereiro de 1982) e trazê-la de volta, com roupagem esfarrapada, como salvação da lavoura.

E assim permanece uma questão: onde está a memória desse Estado?

Anselmo querido: a luta ambiental em Mato Grosso do Sul ficou órfã e o Pantanal secou suas águas. Agora só há corixos engasgados e rios cortados pela dor da sua perda.

Maria Eugênia Carvalho do Amaral, doutora em Ecologia pela UNICAMP, foi professora e pesquisadora da UFMS. É consultora na área de Ecologia e Biodiversidade.

22 October 2007

Escravos da técnica

Os tempos modernos fizeram muito bem a todos nós. Tão bem que já não sabemos como a humanidade pôde viver tanto tempo sem as maravilhas descobertas pela ciência e popularizadas como tecnologias. Celular, computador, carro, biocombustíveis, técnicas cirúrgicas de altíssima precisão, remédios ultra-modernos. A vida ficou mais prática e ficamos com o tempo gasto em tarefas manuais finalmente liberado para fazer o que realmente importa.

O volume de conhecimento tecnológico desenvolvido pela humanidade nos últimos 100 anos é tão grande que já não há saber enciclopédico que dê conta de dominá-lo. Aliás, sabemos muito pouco sobre o mundo moderno de que nos cercamos. Sabemos usar as coisas, mas não sabemos do que elas são feitas – e menos ainda dos efeitos dessas coisas.

Durante o II Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, o engenheiro civil Miguel Sattler deu a todos os presentes um exemplo contundente disso. Com uma garrafinha de água mineral nas mãos, da marca Charrua, comentou com os presentes que segundo a Resolução 20/86 do Conama, os teores aceitáveis de nitrato na água para consumo humano vão até 10mg/L. Pois bem, o rótulo da garrafinha em questão anunciava que aquele recipiente continha 34mg/L de nitrato – uma substância prejudicial às funções renais. A informação simples e clara provocou um efeito estarrecedor na platéia de cerca de 300 pessoas. Imediatamente garrafinhas de água mineral foram sacadas de bolsas e tabelas de valores conferidas. “Esse aqui nem tem informação”, espantou-se alguém.

E essa é apenas uma das muitas informações sobre dezenas de substâncias potencialmente tóxicas ou cancerígenas citadas por Sattler em sua palestra sobre cidades sustentáveis, no painel dividido com o jornalista André Trigueiro. As informações vão desde as dioxinas dos plásticos até as substâncias químicas usadas na fabricação de tintas e para impermeabilização de madeira.

Acostumados a aceitar o que a técnica nos vende banhada em incontestabilidade científica, não questionamos mais nada, não perguntamos para onde vai nosso lixo, em quê ele se transforma, que impactos pode ter no ambiente e na nossa saúde. Consumimos indiscriminadamente substâncias químicas as mais diversas sem questionar nada.

Nossa única exigência é que cada novo produto seja menor e mais prático, para nos poupar o já tão escasso tempo. Tempo que antes empregávamos cozinhando o que comemos, lavando o que sujamos e andando entre um lugar e outro e que hoje gastamos em tratamentos médicos, brigando com eletrodomésticos e queimando combustíveis fósseis desnecessariamente para vencer mil metros.

Mas nós, escravos da técnica, temos fé. Fé que sempre virá uma nova técnica que vai nos salvar dos problemas que provocamos com as atuais.

17 October 2007

MT sediará o 3º Congresso de Jornalismo Ambiental

Rios Vivos - O próximo encontro entre ambientalistas, ecojornalistas, cientistas e autoridades da área ambiental será na capital do Mato Grosso, Cuiabá. A decisão foi aprovada em plenária durante o 2º Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, sediado em Porto Alegre/RS neste mês de outubro. A organização do evento posterior, em 2009, será coordenada pelo NEM – Núcleo de Ecojornalistas dos Matos, composto por profissionais de comunicação dos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
O NEM foi criado em outubro de 2005, durante o I Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental com objetivo de fazer uma conexão entre os biomas existentes nos dois Estados brasileiros e fomentar a divulgação de informações voltadas à formação de indivíduos críticos frente ao avanço da degradação ambiental nestas regiões.
Comunicação ambientalO aumento das pressões econômicas como a produção de biocombustíveis, soja e outras monoculturas, a expansão da pecuária e a crescente demanda por ferro e aço que resultam nos desmatamentos de florestas para produção de carvão vegetal para siderúrgicas, são ameaças à conservação do Pantanal e Cerrado.
Apesar disso, existe pouca inserção de informações sobre essas questões nas mídias locais. De acordo com a jornalista do NEM, Patrícia Zerlotti, “a realização do Congresso no Mato Grosso irá contribuir para o aumento da produção e difusão de informações que fortaleçam iniciativas de conservação, desenvolvimento sustentável e educação ambiental em toda região Centro-Oeste”.